sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Avança a criação dos títulos de “Donos dos Rios”.

by Ivo Pugnaloni 7 comments

Nota Técnica 291/09 da ANEEL institucionaliza os cartéis e a falta de isonomia na análise de inventários hidroenergéticos.

Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni*


A ANEEL acaba de publicar no DOU de 20.10.09 o Aviso da Consulta Publica 058/09 e a Nota Técnica 291/09 SGH/ANEEL aprovada pelo superintendente de gestão e estudos energéticos, Jamil Abid, para mudar as regras de inventários dos rios brasileiros.

Não haverá Audiência Publica, mas Consulta Pública. Não haverá sessão pública, debates, vídeo, imprensa e nem microfones. Contribuições, só por escrito, até 18 de novembro. Enquanto aprovar novas regras, a SGH/ANEEL quer proibir o protocolo de novos inventários.

As mudanças são claramente favoráveis à concentração do mercado e incentivam de forma aberta, à formação de cartéis, em contraposição ao regime principiológico da lei 9427, que criou a ANEEL e os princípios da economia de mercado. Vale lembrar que, com a Resolução 343/08, o inventário escolhido pela SGH dá preferência, aos seus autores, sobre todo o potencial hidráulico do rio.

As principais mudanças:

1. Após o primeiro registro, prazo de 60 dias para outros interessados.

2. Para “economizar”, “evitar discordâncias quanto a dados básicos” e confessando querer “favorecer a composição entre os agentes e não a disputa” , os interessados são obrigados a se articularem e contratarem, conjuntamente, os serviços de campo e demais ( topografia, geologia, hidrologia, sedimentologia, meio ambiente e a fixarem, em conjunto, os parâmetros principais dos projetos;

3. A nota não esclarece: ( i ) sob coordenação de qual dos interessados se dará essa contratação? (ii) como resolver divergências sobre preços e qualidade?

4. Ao final do prazo, os interessados, deverão entregar cada um deles, a sua melhor proposta de partição de queda. Se todos entregarem a mesma divisão, a decisão vai para sorteio ou comparação da qualidade gráfica...

5. O aceite dos estudos não será da responsabilidade da ANEEL, mas “terceirizado” a profissionais cadastrados pela SGH. A ANEEL só escolherá a melhor partição de quedas.

6. Melhor dizendo, a SGH escolherá aquela partição que os interessados, reunidos num óbvio e escandaloso cartel, já terão escolhido, como aquela que um deles, de comum acordo irá apresentar. Um terá a prioridade nesse rio, o outro no outro rio e assim por diante...


Chamamento à reflexão e à ação dos empresários de PCHs

No Brasil não precisamos de mudanças para “divisão do bolo pelos maiores”, que impeçam a competição em nome da “ligeireza” e da “falta de pessoal”. A falta de velocidade da SGH, como veremos a seguir, não é devida só a que, inexplicavelmente, apenas 12 técnicos sejam obrigados a analisar 37.000 MW de projetos e inventários, apesar da agencia devolver 150 milhões por ano ao tesouro.

Existe outra causa muito mais grave, já apurada pela procuradoria e o novo diretor geral da ANEEL já tomou medidas a respeito, no despacho 1828/09.

Leia o inciso III e depois, o relatório.

E finalmente, leia o voto do Diretor José Roberto Senna. Neles fica claro que a SGH, por escrito, afirma que “como praxe interna” já vinha cometendo uma grave irregularidade, que afronta à isonomia de tratamento, à impessoalidade e à igualdade de condições.

Qual foi essa irregularidade? Caro colega empresário, responda a essa pergunta: terá você sido avisado pela SGH/ANEEL de que o “check-list” de projetos básicos não precisava ser cumprido na integralidade, mas só 80% dele? O Parecer da Procuradoria da ANEEL mostra que não eram “coisinhas” que foram “desculpadas” , mas a falta de sondagem geotécnica, desrespeito a cotas de inventário, etc.
Talvez por isso, o item 34 da nota técnica 291/09 quer que não se exija, na integralidade, o cumprimento dos itens dos check-list. Ou seja, mude-se a regulamentação para todos nos adaptarmos à irregularidade e não ocorra a anulação de todos os aceites concedidos de forma irregular.

Já estou vendo a “gritaria”: “Se houver a anulação dos aceites vamos perder todo nosso trabalho! Os processos vão parar!”E eu responderia: Será que os processos vão parar ou será agora é que eles vão realmente andar? Afinal, se eliminarmos os processos irregulares, quem ficarão serão os únicos que deveriam ainda estar na disputa: os processos regulares. Ou seja, menos processos. E se os outros são irregulares, a justiça não lhes favorecerá.

E nos itens 32 e 33 da NT 219/09: não parece que a SGH quer um “cheque em branco”?

“Incluir na Resolução a competência para que a SGH discipline temas polêmicos relacionados aos estudos de inventario é imperativo para que área tenha condição de atuar sem ser constantemente questionada sobre suas decisões. A natureza da atividade impede que se tenham soluções únicas e padronizadas pois as situações que se apresentam são complexas e distintas, existindo circunstâncias que devem ser tratadas caso a caso”
Já pensou nos reflexos dessa “liberalização de 80% do aceite” para a qualidade dos serviços? Você já pensou em quantas disputas já poderiam estar encerradas, projetos em construção, gerando, pagando financiamentos, gerando lucro?

Já pensou que aquele seu projeto já estaria aprovado, se “aquela disputa com meu concorrente” já estivesse resolvida? Já pensou se seu concorrente, que entregou um projeto pela metade, já tivesse sido eliminado, não fosse “a praxe interna ( um Ato Secreto? ) dos 80%”? Acabe-se com essas irregularidades comprovadas pela própria diretoria e um projeto não levará mais três, quatro ou mais anos na ANEEL para ser aprovado.

É preciso investigar também se não terão sido essas disputas intermináveis, causadas pela complacência no aceite de estudos falhos , que pode explicar porque embora tenha aprovado mais de 430 projetos de PCHs desde 1998, a ANEEL tenha hoje menos de 90 concluídas ou em construção.

Embora seja preciso investigar também se a não-construção pode ter a ver com a falta de efetiva fiscalização da SFG, pois afinal, o numero de Autos de Infração emitidos vem diminuindo ao longo do tempo, de 10 autos em 2001 para, 8 em 2002, 3 em 2003 e nenhum auto de infração em 2005 e 2006, subindo para 31 apenas em 2007. Ou será porque a ANEEL nunca, antes de 2007, havia intimado nenhum autorizado a construir ou perder a outorga? [ veja o gráfico aqui ].


As mudanças que realmente precisamos na SGH/ANEEL

Um Brasil moderno, competitivo e eficiente deve ser um Brasil sem cartéis, com regras estáveis, que só possam ser alteradas com justificativas claras. Lembremos, que essas barbaridades não serão aplicadas só para PCHs e que as regras atuais levaram o governo federal a conseguir a competição e a economia de 20% no preço da energia nos leilões de Santo Antonio e Girau.

Mas competição é exatamente o que a SGH pretende eliminar com a Nota Técnica 219/09:

“Item 75. Além disso, esse critério busca promover a composição entre os diversos agentes, ao invés da disputa. Para não abrir mão de parcela do direito de preferência, poderiam conciliar os interesses...”
Curioso por que no dia 8 de outubro, Dia Nacional contra a Ação dos Cartéis, em solenidade no Ministério da Justiça, Sua Excelência, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, esposou tese diametralmente oposta à defendida pela SGH, como pode ser visto aqui.

E agora? Como fazer? Que opinião prevalecerá? A do presidente ou a da SGH?

Por ocasião da mudança da resolução 395/98 , dissemos que era absurdo atribuir, por 25 anos, os direitos de exploração de um rio inteiro a um único interessado, apenas porque autor de um inventário “escolhido” pela SGH.Isso é muito subjetivo! Haverá montes de ações judiciais!

Isso seria criar o título de “Dono do Rio”, que irá ganhar muito dinheiro não gerando energia, mas vendendo essa sua “preferência” para terceiros, privatizando a gestão dos recursos hídricos. E roubando recursos à construção para favorecer à deslavada especulação.

Afinal, para quê alguém irá investir em geração se for mais lucrativo e menos ariscado comercializar autorizações da ANEEL? Ou ainda: para quê construir usinas hidroelétricas, se quanto menos energia de fonte renovável, mais usinas térmicas a diesel e óleo combustível serão despachadas, propiciando maiores ganhos aos seus proprietários?

De nossa parte, obedecendo à lei 9784, na qualidade de administrados, solicitaremos audiência com o Sr diretor geral da ANEEL, para como fazem os grandes empresários, pedir providências quanto às nossas preocupações sobre possíveis efeitos das irregularidades por ele mesmo constatadas, sobre os projetos e inventários sob nossa responsabilidade técnica.

Isso tudo é muito importante e precisa ser verificado pelos senhores diretores da ANEEL , pelo Ministro Lobão, Ministra Dilma Roussef e pelo Presidente Lula, aos quais me atrevo a dizer, sem medo de errar:

POUCO ADIANTA O MAR ALTO E O PRÉ-SAL, SE NOSSAS NÃO FOREM AS AGUAS INTERIORES DO BRASIL!

Olhe pela ANEEL, presidente Lula!

Ela também precisa de sua atenção, carinho, reforços, compreensão e estímulo. O setor elétrico e toda a sociedade, que dele depende para viver, agradecerão muito.

( * eng. eletricista, ex-diretor da COPEL, diretor da ENERCONS [ www.enercons.com.br ])



Leia mais e dê sua opinião comentando em [ http://www.tribunadosetoreletrico.blogspot.com/ ]

Leia mais sobre o assunto em [UMA ITAIPU DE POLUIÇÃO, ENERGIA CARA E AQUECIMENTO GLOBAL]

Comments 7 comments
Anônimo disse...

Parece que lá na ANEEL é a turma do Fernando Henrique e do PFL-DEM que continua mandando,( legado do tempo do ACM no MME?)e que o negócio dos funcionários e gerentes "técnicos" é estimular e facilitar a privataria...Acorda Lobão! Acorda PMDB e PT! Acorda governo Lula!

Zé Maria disse...

EU NÃO ME ESPANTO COM MAIS NADA NO BRASIL! DEPOIS, QUANDO OS RIOS BRASILEIROS ESTIVEREM TODOS LOTEADOS O GRANDE LULA VAI DIZER "QUE EU NÃO SABIA DE NADA!"OU AINDA : "ANEL? QUE ANEL? EU NEM TENHO DEDO PARA COLOCAR ANEL!!!

Laércio disse...

Impressionante esse caso do "aceite" com 80% do "check-list" atingido...Será que isso aconteceu só dessa vez, com essa empresa, ou é uma prática antiga? Na nossa empresa o check-list da ANEEL e os manuais de inventário e de projeto são seguidos linha por linha. O pior é que está tudo bem documentado. Será que é porisso que a SGH andou enviando um ofício há uns meses atrás, pedindo para quem tinha pendências, "completar os projetos" e dias depois mandou outro, dizendo que se tivesse concorrentes não poderia haver complementação? Isso está muito estranho mesmo. E eu já havia reparado: para algumas empresas tudo, para outras, os rigores da Lei.

John da Silva disse...

A petralha está p. da vida porquê? Quem não tem competência não se estabelece. Faça menos política, trabalhe mais e deixe de choradeira, seu Ivo. A fila anda.

Anônimo disse...

falta de imaginação dessa turma.

Edson G disse...

As grandes empresas só tem um medo: perderem dinheiro brigando uma com a outra por preço nos leilões como aconteceu no Santo Anotonio e no Jirau. Além disso, age por trás do pano o "lobbynho" para que as UHEs entre 30 e 50MW sejam divididas irmãmente entre as 7 irmãs do cartel, sem chance para que alguma das menores poderem ficar com algum desses potenciais.
Mas foi hilária a forma como esse pessoal escreveu a NT 291/09 lá isso foi.Deu muito na cara! Ficou muito evidente a vontade de formal um baita "acordão"...Vai ser duro de provar que isso não é um cartel, lá isso voi...

Edson G disse...

As grandes empresas só tem um medo: perderem dinheiro brigando uma com a outra por preço nos leilões como aconteceu no Santo Anotonio e no Jirau. Além disso, age por trás do pano o "lobbynho" para que as UHEs entre 30 e 50MW sejam divididas irmãmente entre as 7 irmãs do cartel, sem chance para que alguma das menores poderem ficar com algum desses potenciais.
Mas foi hilária a forma como esse pessoal escreveu a NT 291/09 lá isso foi.Deu muito na cara! Ficou muito evidente a vontade de formal um baita "acordão"...Vai ser duro de provar que isso não é um cartel, lá isso voi...

Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni
Engenheiro eletricista, ex-diretor da COPEL, atual diretor da ENERCONS Consultoria em Energia Ltda.
ivo@enercons.com.br

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