quarta-feira, 20 de agosto de 2008

DISTRIBUIDORAS E SUPER-GERADORAS EM FESTA! PROPOSTA DA ANEEL QUER ELIMINAR PROTEÇÃO AOS DEMAIS AGENTES

by Ivo Pugnaloni 2 comments

Discretamente, sem alarde, a minuta de resolução que a ANEEL pretende ver implantada elimina restrições importantes à concentração do mercado de geração em mãos de poucos agentes.

Ela simplesmente acaba com os critérios de preferência inversa que hoje são previstos nos incisos I, II e IV do Artigo 18 da Resolução 395/98.

MAS NEM UMA PALAVRA SOBRE "RETIRADA ESTRATÉGICA" É DITA NA NOTA TÉCNICA 107/08! ( que terá acontecido? um esquecimento? é coisa sem-importância )

Veja o que diz hoje o Art 18 da Resolução 395/98, para estimular a concorrencia entre os agentes e dificultar a concentração do mercado:


"Art. 18. Decorrido o prazo previsto no art. 17 desta Resolução, e existindo,
além do primeiro requerente, outros interessados no aproveitamento, com projetos
em condições de ser aprovados, a ANEEL, visando aumentar o número de agentes
produtores de energia elétrica e assegurar maior competitividade para a outorga
de autorização, utilizará os seguintes critérios de seleção, pela ordem:

I - aquele que possuir participação percentual na produção de energia
elétrica do sistema interligado inferior a 1% (um por cento);
II - aquele
que não seja agente distribuidor de energia elétrica na área de concessão ou
sub-concessão na qual esteja localizado o aproveitamento hidrelétrico objeto da
autorização;
III - aquele que for proprietário ou detiver direito de livre
dispor da maior área a ser atingida pelo aproveitamento em questão, com base em
documentação de cartório de registro de imóveis;
IV - aquele que possuir
participação na comercialização de energia elétrica no território nacional
inferior ao volume de 300 GWh/ano. "

Embora seja importantíssimo, a Nota Técnica 107/08 não faz menção a esse detalhe, como se “nada tivesse acontecido”, muito embora ele acarrete em riscos de que enormes áreas sejam dominadas por um único agente.

Isso prova que embora aparente se diga que a mudança é “favorável aos médios investidores” a mudança é uma arma de dois legumes: um pepino e uma cenoura.

A flagrante omissão desse enorme favor às distribuidoras, já recomendaria cautela a investidores que, ofuscados pelas aparentes vantagens iludem-se com o que acham que de bom existe nas mudanças, esquecendo-se de analisar riscos e desvantagens.

Risco desses e outros “estímulos”, como o à elaboração de novos inventários

A proposta menciona várias vezes pretender “estimular” e “reconhecer” o esforço dos agentes que elaboram os inventários.A realidade porém é que a página “Acompanhamento de Estudos e Projetos” do site http://www.aneel.gov.br/ torna disponíveis nada menos que 110.000 MW de inventários aguardando a elaboração de projetos básicos pelos agentes.
Enquanto isso, 27.000 MW de projetos já elaborados aguardam a análise da ANEEL.

Ou seja, o que o que está faltando para estimular a elaboração de novos inventários é mais pessoal trabalhando na ANEEL.

E não aumentar os já elevadíssimos riscos de subjetividade e de influências políticas no julgamento do melhor inventário.

Analisando e aprovando mais rapidamente os projetos, sinalizando aos agentes que existe fluência e a continuidade das ações governamentais, a ANEEL estará assegurando que vale a pena investir em novos inventários.

E para isso, apenas 12 analistas é muito pouco.

Risco de trocar-se o critério objetivo de “SIM” ou “NÃO” por outro, altamente subjetivo de “O MELHOR”

A ANEEL afirma que para “estimular a descoberta de novos potenciais e a realização de novos inventários, reconhecendo a importância dos agentes”, pretende antecipar a disputa pelos potenciais já para a fase de inventário.

Significa também que para selecionar o interessado vencedor, a ANEEL pretende trocar a objetividade do critério atual (que é a titularidade da maior área atingida dentre os que tenham apresentado projetos em condições de aprovação), pela subjetividade da escolha por uma comissão de funcionários da ANEEL, que “selecionará o melhor inventário”.

Compara-se a seguir as duas situações.Hoje a aprovação do inventário não gera direito na autorização. Assim, caso a seleção for, de alguma forma, influenciada por fator subjetivo, não provocará prejuízo grave.Além disso, se não há benefício com a escolha, menor é a possibilidade de favorecimento indevido.

A seleção do interessado hoje se faz após a análise e aprovação dos projetos básicos dos concorrentes, em duas etapas.

Na primeira, há o “aceite”, quando os projetos, para poderem ser analisados, devem cumprir duas exigências: (i) obedecerem ao inventário quanto aos parâmetros definidores do potencial hidráulico e (ii) possuírem todos os itens exigidos pelo Manual “Diretrizes para Projetos de PCHs” , elaborado pela ELETROBRÀS.

Na segunda fase,de “análise”, os projetos são estudados com maior profundidade, para determinar se tem condições, ou não, de serem aproveitados.

Ou seja, hoje a margem para subjetividade existe mas é reduzida, pois não há escolha do “melhor projeto”, que exige abertura de todo o processo.Apenas se analisa cada um deles e emite-se um resultado : “Sim, atende ao Manual”. Ou “Não, não atende ao Manual”.

Na forma pretendida pela ANEEL, em vez de analisar se os projetos atendem ou não a critérios técnicos e objetivos, de fácil comprovação, se selecionará qual inventário é o “melhor”, o que aumenta os riscos da subjetividade, das injunções políticas, das simpatias e das antipatias, dos recursos, das perícias e das medidas judiciais.

Hoje vários projetos podem atender ao Manual, mas apenas um será aprovado pois terá comprovada por documentos de cartório a titularidade da maioria da área atingida.E ter resolvida a titularidade das terras no local que se quer construir é sem dúvida uma necessidade básica e fundamental em qualquer empreendimento, exigida por todos os órgãos governamentais e privados, inclusive para seu financiamento.

Ou será que pode interessar ao Poder Público ou a algum investidor que, após a autorização, iniciada a construção ainda existam demandas judiciais quanto à terras alagadas?

Os riscos da ANEEL não mais analisar outros aspectos que não os ligados ao potencial hidráulico

A proposta da ANEEL prevê que apenas os aspectos relacionados ao potencial hidráulico sejam considerados.

E que ela não mais aprove projetos, mas só dê seu “aceite”.

Essa proposta é um grave retrocesso, com grandes riscos aos investidores e à sociedade.

Em primeiro lugar porque dará aos autores de inventário, um sinal, um estímulo, para “forçarem” ao máximo o aproveitamento do potencial dos rios, mesmo em pontos de grande impacto ambiental, pois iriam precisar disso para ganhar a concorrência;

Em segundo lugar porque a subjetividade do julgamento aumentará muito. Os interessados nunca poderão saber até que ponto “a preponderância” dos elementos ligados ao potencial elétrico a ser considerada, ou até que ponto devem forçar o aproveitamento de qualquer potencial do rio;

Em terceiro lugar porque, “lavando as mãos” de analisar se o projeto atende às questões ambientais, geológicas e das demais áreas da engenharia, a ANEEL estará reduzindo a sua qualidade e transferindo o problema para os investidores que comprarem as autorizações ou se associarem aos que as obtiveram;

Em quarto lugar porque além disso ser uma renuncia ilegal de suas atribuições, vedada por Lei, vai colocar em risco não só os investidores, mas a bens, animais e a vida das populações a jusante dos reservatórios, sujeitando a União Federal às conseqüências da responsabilidade objetiva em caso de acidentes com vidas humanas, prejuízos materiais, inundações, desmoronamentos, afogamentos, perdas em lavouras, pecuária, industrias, etc.

Em quinto lugar, a orientação da ANEEL aumentará exponencialmente os riscos de conflitos com as comunidades locais, com as organizações ambientalistas, órgãos ambientais estaduais e com o ministério público, no momento em que internacionalmente o Brasil e outros países emergentes são cobrados pela comunidade internacional quanto a observância dessas questões;

Em sexto lugar porque aumentará ainda mais subjetividade do processo de seleção do inventário já que os interessados poderiam preferir prever aproveitamentos de elevados impactos ambientais, que nunca poderão ser construídos, por serem inviáveis ambientalmente, mas que precisarão ser previstos, prospectados e projetados a níveis de profundidade incompatíveis com a fase preliminar em que são elaborados;

Em sétimo lugar por que esse aprofundamento aumentará o custo dos estudos de inventário o qual, por seu caráter exploratório e pioneiro, deve ser necessariamente menos custoso, pois exposto a maiores riscos de não prosperar do que um projeto básico.
A Nota Técnica 107/08 diz ainda que a ”nova” metodologia de seleção de interessados favorece aos empreendedores pois estas irão “economizar em projeto básico”, pois apenas um interessado iria elaborá-lo, já que a seleção iria dar-se já na fase de inventário.
Diz, além disso, que com ela, “a agência irá economizar em atividades de análise de projeto” e as disputas entre interessados seriam trazidas da fase de projeto para a de inventário.
Ora, todos sabemos que, para evitar custos desnecessários, a precisão dos estudos na fase de inventário é bem reduzida, devido à natureza exploratória desse tipo de estudos, como prevê aliás o próprio Manual de Inventário Hidroenergético de Bacias Hidrográficas” , também elaborado pela ELETROBRÁS.Como poderá ser escolhido, nessa fase, com a objetividade necessária, “o melhor inventário”, se o nível dos estudos ainda é apenas exploratório?
A perspectiva é de extrema demora na conclusão desses casos e que vem a ocorrer, por meio de “acordos” entre as partes conflitantes, por meio de um verdadeiro “toma-lá-dá-cá” em que um agente desistirá de uma demanda num processo, em troca da desistência do oponente em outro processo, transformando a ANEEL em palco de negociações que poderiam, junto com o indigitado sorteio, desgastar sua imagem enquanto Instituição Federal.

Comments 2 comments
Anônimo disse...

cara!
é melhor ler seu blog do que o próprio Canal Energia!
Parabéns!

Anônimo disse...

cara!
é melhor ler seu blog do que o próprio Canal Energia!
Parabéns!

Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni
Engenheiro eletricista, ex-diretor da COPEL, atual diretor da ENERCONS Consultoria em Energia Ltda.
ivo@enercons.com.br

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